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solitudine

Quando pulo quase, que abortado, da cama, ela muito já está desperta.
Sorri de olhos fechados e se aninha em meus braços.
Está sempre a dois passos a minha frente, mas cuida do vácuo atras de mim.
No silêncio, numa quietude escura, sólida, maciça.
Ela é a minha solitude.
ela olha por mim, cuida pra que eu não seja enganado, que eu não me machuque.
é seu interesse me ter inviolado,
Mas me tem como escravo, senhora altiva, filha-da-puta.!
Drena minhas energias, vampira!
Mas quando chego do trabalho cansado ela é tudo o que quero encontrar.
E ela está nua, morna, e pálida no divã, a me esperar com uma cerveja aberta, um baseado enrolado, a luz do abajour ligada...

Ela é a viúva de veludo.
Jurei que cometeríamos o suicídio juntos.
Numa banheira morna, eu e ela.
Uísque, heroína...
Ou mesmo no trailer sujo.
Às vezes me confundo com ela e vice-versa.
Mas não, ela é só a minha solitude e minha solidão.

Quando não estou com ela sou outra pessoa:
Alegre, falante, realizado... todos aqueles adjetivos do homem moderno, sabe?
Mas quando encontro com ela minha alma é despida.
Seu olhar atravessa tudo o que pode ser considerado eu.
Eu, esse ponto no fluxo.
Ela, meu vampiro privado, minha solitude,
Que segura por dentro da minha mão gelada.
Que me consola quando o mundo é demais,
Quando o mundo é algo insólito e absurdo e bizarro
Ela está lá para me trazer familiaridade com as coisas.

Ela é meu círio eterno na escuridão abissal.
Ela, navalha sempre afiada
Cujo corte é indolor e eficientemente mortal.
E mortal porque indolor.
Ela, que corta essas amarras que tenho com essa terra de gente má,
Essas amarras que estrangulam todas as partes do meu corpo.

Ela é um véu a roçar meu rosto
E ela é tudo o que eu tenho
- Mais até do que minha própria vida!!! -
E acho que no fim ela será a única a restar, como ponto magnético e vibrante no vácuo universal.
Por isso preciso cultivar os laços com essa minha solidão.
Porque ela vai dissolver todo o desespero em solidão. Em silêncio. Solitude.
Minha solitude será a coroação de uma existência!
(Da minha existência)

E quando o barulho da sirene se aproximar, o derradeiro, vou estar dentro dela.
Com meu membro rijo dentro dela.
Dois corpos nus com mensagens de rancor gravadas ao fio da navalha.
Estaremos serenos, porém, em um caso de amor anormal - um homem e sua própria solitude,
A única que o aceitou integralmente.
A única a quem ele aceita!

Em sua forma humana ela é a mais bela das mulheres,
Corpo possante, sorriso enternecedor, capaz de quebrar a mais dura das almas, a alma fria de diamante.
(Alma fria de concreto, na verdade. O meu coração é que é de diamante! Foi ele que sofreu pressões e calor ilimitados no começo das eras.
Foi ele que de tanta pressão se solidificou.
Agora eternamente duro)

Ela, o avião que está sempre decolando, parada no ar, estática.
A doce saudade das pessoas que se tornaram eternas, das pessoas que se tornaram imortais, que nunca mais mudaram,
Ela que tem o dom de paralizar o momento em paixão quando tudo o que paraliza o momento é dor, pois o prazer é flutuação.....
Ela é a minha memória flutuante.
Em seu ventre se fecundaram tudo o que vale a pena em minha vida,
Toda flor que entreguei, que me entregaram....
Toda vida que salvei.
Ela é a violinista que não está mais lá,
A violinista viajante pela qual me apaixonei num domingo de tarde
E que deixou sua lacuna musical No lugar onde abriu seu case de moedas.

Mas se eu sou feliz com ela?!?!?
Ah, a felicidade é outra coisa.
Eu sou um homem que, na hora da tormenta, parou de nadar.
Simplesmente deixou seu corpo à deriva. Sou ao sabor das vagas.
Por enquanto ainda respiro e olho o céu bem daqui do fundo das águas turvas, ainda vejo um pedaço de sol.
Um dia serei tragado por estas águas e vou virar oceano
Numa louca pedra que viaja pelo espaço.
Essa louca pedra viva

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